Madri tem muitos rostos, mas poucos artistas conseguiram retratar sua alma com tanta intensidade quanto Pedro Almodóvar.
Se você já viu algum dos filmes dele, sabe que a cidade nunca é apenas cenário: Madri é personagem viva, pulsante, cheia de paixão, segredos e luz.
Por isso, montar um roteiro de Almodóvar em Madri é mais do que seguir passos de cinema: é uma forma de conhecer a cidade através da lente de um dos maiores diretores da história.
Caminhar por ruas que já viraram cenários de emoções intensas, tomar um drinque nos bares onde personagens icônicos trocaram confidências e até assistir a um filme almodovariano onde ele costuma ser exibido são programas clássicos do roteiro.
O gênio Pedro Almodóvar
Almodóvar não nasceu em Madri, mas foi na capital espanhola que sua carreira e seu estilo tomaram forma.
Ele chegou jovem, nos anos 1960, e mergulhou de cabeça na efervescência cultural que viria a explodir na chamada Movida Madrilenha.
Madri era liberdade, experimentação e transgressão — tudo que alimentou a criação de filmes como Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón, Ata-me!, Tudo Sobre Minha Mãe e tantos outros.
Com protagonistas femininas fortes, personagens LGBTQIA+ e narrativas sobre maternidade, desejo, identidade e arte, seus filmes misturam drama e humor com uma sensibilidade rara.
Sua estética é inconfundível — cores vibrantes, cenários kitsch, trilhas emocionantes e roteiros que tratam da dor com beleza.
Ele deu ao cinema espanhol uma voz única, moderna, plural e profundamente emocional. Fez sucesso internacional sem abrir mão do seu jeito de contar histórias e transformou temas marginalizados — como a sexualidade, a identidade de gênero, o HIV e o vício — em narrativas humanas, universais e acessíveis.
Roteiro de Almodóvar em Madr
1. Plaza Mayor
A Plaza Mayor é um ícone de Madri e tem um papel simbólico em A Flor do Meu Segredo, de 1995. Muita gente lembra da cena em que Leo se encontra com a amiga Betty em um dos bares da praça — um daqueles momentos silenciosos, mas carregados de emoção. O que poucos percebem é que a praça aparece novamente em uma das cenas mais marcantes do filme.
Mais para o final da história, Leo e Ángel caminham pela praça à noite, iluminada e quase vazia. Eles conversam sobre o passado, lembram da época em que se conheceram durante uma manifestação estudantil e compartilham memórias cheias de significado. É uma cena delicada e cheia de subtexto, como só Almodóvar sabe fazer. A praça se transforma, mais uma vez, em cenário emocional da narrativa.
Ao visitar a Plaza Mayor, vale lembrar que ela foi pano de fundo para diferentes fases da protagonista — tanto no reencontro com a amiga quanto no momento de introspecção com Ángel. Esse espaço histórico de Madri, com suas fachadas vermelhas e arcos elegantes, é mais do que bonito: é cinema em estado puro.
2. Plaza de La Villa
Do lado da Plaza Mayor está a charmosa Plaza de La Villa, um dos cantinhos mais antigos e fotogênicos do Centro de Madri — e palco de uma das cenas mais intensas de Ata-me!, de 1990.
Nesse trecho do filme, Ricky, personagem de Antonio Banderas, vai até a praça para comprar heroína. A intenção é aliviar a dor de dente de Marina, vivida por Victoria Abril, atriz que ele sequestrou por amor. Só que, como em todo bom enredo almodovariano, nada é simples.
O que deveria ser uma missão sigilosa vira caos quando Ricky é reconhecido por uma mulher interpretada por Rossy de Palma — a mesma que ele havia assaltado na noite anterior.
A cena se transforma em uma perseguição pelas ruas estreitas que seguem até a Calle del Cordón, com tensão, ritmo acelerado e aquele toque de humor absurdo que só Almodóvar sabe conduzir.
Passar por essa praça durante o seu roteiro de Almodóvar em Madri é como revisitar um momento em que a cidade vira palco de um romance disfuncional e eletrizante.
3. Taberna Ángel Sierra
De lá, siga para o bairro de Chueca, que tem tudo a ver com o diretor. Centro da vida LGBTQIA+ madrilenha, Chueca é colorido, animado, moderno e tradicional ao mesmo tempo. Durante os anos 1980, foi um dos epicentros da Movida, movimento que influenciou profundamente o estilo visual e narrativo de Almodóvar.
Um ponto imperdível é a Taberna Ángel Sierra, na Plaza de Chueca. Esse bar histórico, com seus espelhos antigos e paredes cobertas de azulejos, parece saído direto de um filme. E de certa forma, é mesmo: ele é o retrato da Madri popular e ao mesmo tempo excêntrica que tanto aparece na filmografia do cineasta.
Na Taberna foram filmadas cenas do filme Mães Paralelas, de 2021, como também já foi filmado em 1995 o filme A Flor do Meu Segredo.
Chueca tem aquele clima de liberdade criativa que define o cinema de Almodóvar. Aproveite para caminhar sem pressa pelas ruas do bairro, espiar vitrines, entrar em lojinhas descoladas e respirar a atmosfera dessa parte tão vibrante da cidade.
4. Puerta de Alcalá
De todos os filmes de Almodóvar, Carne Trêmula, de 1997, talvez seja o que mais me marca quando pensamos em Madri. A cidade não é apenas cenário — ela é presença, sentimento, atmosfera. A cena de abertura é inesquecível: Penélope Cruz, grávida e sozinha, atravessa a cidade dentro de um ônibus vazio, a caminho do hospital. Está de madrugada, tudo está escuro, silencioso, e Madri aparece linda e assustadora ao mesmo tempo.
Essa sequência passa pela Puerta de Alcalá, uma das construções mais emblemáticas da cidade, que surge iluminada sob as luzes da madrugada.
O contraste entre a tensão do momento e a beleza da paisagem urbana diz muito sobre o estilo de Almodóvar. Para quem segue um roteiro de Almodóvar em Madri, esse é um ponto obrigatório — não só pela importância arquitetônica, mas pela emoção gravada em cada segundo da cena.
5. Museo Chicote
Na icônica Gran Vía de Madri, o Museo Chicote se destaca com sua fachada de néon e uma história que atravessa gerações. Fundado em 1931 como a primeira coquetelaria da Espanha, ele mantém até hoje o charme Art Decó projetado por Luis Gutiérrez Soto. E claro, não poderia faltar em um roteiro de Almodóvar em Madri.
O diretor usou o interior do bar como cenário para uma das cenas mais fortes de Abraços Partidos, de 2009.
É no Chicote que Judit, interpretada por Blanca Portillo, se senta para tomar uns drinques com o filho e Harry Caine, vivido por Lluís Homar. Entre goles e olhares pesados, ela revela verdades que mudam tudo. A cena é intensa e carregada de emoção — o tipo de momento que Almodóvar transforma em arte.
Visitar o bar, sentar em uma das mesas com iluminação baixa e pedir um coquetel clássico é como entrar, por alguns minutos, num pedaço do seu cinema.
6. Cine Doré
Em Fale com Ela, de 2002, Benigno, interpretado por Javier Cámara, vai ao Cine Doré, um dos cinemas mais antigos de Madri que ainda funciona em pleno vapor. O prédio, com fachada charmosa e interior retrô, é hoje sede da Filmoteca Espanhola e tem uma programação cheia de preciosidades — muitas vezes, com filmes do próprio Almodóvar.
Essa mesma sala reaparece em Dor e Glória, de 2019, em uma cena tocante onde o protagonista Salvador Mallo, personagem de Antonio Banderas, também revisita o passado sentado na penumbra do cinema.
O Cine Doré, para Almodóvar, é mais do que locação: é símbolo da cinefilia, da memória e do poder curativo da arte. Para quem segue um roteiro de Almodóvar em Madri, assistir a um filme ali é uma das experiências mais emocionantes — como se você fizesse parte do roteiro também.
7. Bar Cock
Se o Museo Chicote é símbolo de tradição, o Bar Cock representa o lado mais boêmio e artístico da noite madrilenha. Ele também aparece em Abraços Partidos, onde Diego, personagem de Tamar Novas, atua como DJ.
O bar fica pertinho da Gran Vía, na Calle de la Reina, e tem uma história que se confunde com a própria vida noturna da cidade: aberto nos anos 1920, foi nos anos 1980 — auge da Movida Madrileña — que o Cock virou ponto de encontro de cineastas, artistas e intelectuais.
É quase certo que Almodóvar já passou muitas vezes por ali na vida real, o que só aumenta o peso simbólico da sua aparição no filme.
O interior preserva o estilo britânico original, com madeira escura, vitrais esculpidos e uma atmosfera que pede um martíni e uma conversa profunda. Se você está seguindo um roteiro de Almodóvar em Madri, esse é um lugar obrigatório para uma pausa noturna cheia de estilo.
8. Centro Cultural Conde Duque
As noites de verão em Madri são quentes — muito quentes mesmo — e é nesse clima abafado que acontece uma das cenas mais icônicas de A Lei do Desejo, de 1987.
No entorno do atual Centro Cultural Conde Duque, Tina, vivida por Carmen Maura, caminha pela rua, exausta pelo calor da madrugada, quando avista um gari lavando a calçada. Sem pensar duas vezes, ela pede que ele jogue água nela também — e ele atende, sem julgamentos.
A cena é simples, mas poderosa. Tina, molhada no meio da rua, é uma imagem de liberdade, entrega e vulnerabilidade, tudo ao mesmo tempo.
É exatamente esse tipo de contraste entre o banal e o extraordinário que Almodóvar domina tão bem.
Hoje, o antigo quartel militar que aparece na cena abriga um centro cultural cheio de eventos, exposições e vida. Se você estiver montando um roteiro de Almodóvar em Madri, esse é um ótimo lugar para visitar — e quem sabe até desejar um banho no meio da rua.
9. La Bobia
Poucos lugares representam tão bem o espírito da Movida Madrileña quanto La Bobia, um bar que era ponto de encontro nos anos 1980, especialmente entre artistas, músicos e cineastas.
Ele foi o cenário de uma das cenas mais emblemáticas de Labirinto das Paisões, de 1982, um dos primeiros filmes de Pedro Almodóvar, com Imanol Arias e Fabio McNamara dividindo a tela.
Na vida real, McNamara foi parceiro musical do próprio Almodóvar e a cena em La Bobia traduz bem aquele tempo de ousadia, cores e liberdade.
Hoje, o espaço funciona como uma taberna moderna, com ambiente contemporâneo e pratos da cozinha asturiana. Ainda assim, quem conhece o passado sente que há algo do clima dos anos 1980 impregnado nas paredes.
Para quem segue um roteiro de Pedro Almodóvar em Madri, é uma parada cheia de história, sabor e contexto cultural.
10. Café Moderno
Em Mães Paralelas, Pedro Almodóvar volta a usar Madri não só como cenário, mas como parte íntima da vida de seus personagens. A protagonista Janis, vivida por Penélope Cruz, mora no número 1 da Plaza de las Comendadoras e isso torna natural que, em um momento de pausa, ela desça até a charmosa esplanada do Café Moderno.
Esse café é um clássico do bairro de Conde Duque, famoso pelas tardes ao sol no verão e pelos cafés quentinhos no inverno.
Com uma decoração que mistura Art Déco e toques modernistas, o lugar mantém até hoje o espírito dos anos 1980, quando também era ponto de encontro da cena cultural madrilenha.
A cena do filme é simples, mas cheia de significado e retrata com fidelidade aquele lado cotidiano que também é cinema. Para quem está seguindo um roteiro de Pedro Almodóvar em Madri, sentar em uma das mesas do Café Moderno é como entrar em um momento de pausa narrado por ele mesmo.
11. Taberna Alhambra
A poucos passos da Puerta del Sol, a Taberna Alhambra é um dos lugares mais tradicionais da cidade — e um dos mais visitados pelos viajantes curiosos.
Inaugurada em 1929, ela mantém até hoje a decoração com ares andaluzes e um cardápio cheio de tapas que fazem sucesso entre locais e turistas. E claro, Almodóvar também passou por ela com suas câmeras.
Em O Que Eu Fiz Para Merecer Isso?, de 1984, a taberna é cenário de uma cena simples e poderosa: a avó, interpretada pela inesquecível Chus Lampreave, se encontra com o neto e um amigo dele. Os três dividem a mesa e a conversa em um ambiente carregado de realismo.
É um daqueles momentos em que Almodóvar transforma o cotidiano em poesia visual, mostrando como um lugar popular pode carregar histórias profundas. Tem que esta no seu roteiro de Almodóvar em Madri.
12. Círculo de Bellas Artes
No comecinho de Tudo Sobre Minha Mãe, de 1999, há uma cena em que Manuela, de Cecilia Roth, a mãe dedicada e cheia de cicatrizes emocionais, espera o filho na calçada para irem juntos ao teatro.
Essa espera acontece em frente ao Círculo de Bellas Artes, um dos espaços culturais mais importantes de Madri — e que é um lugar imperdível.
O prédio fica na Calle de Alcalá e só a fachada já tem presença. É emocionante saber que essa cena tão delicada foi gravada bem nesse ponto, onde o cinema e o teatro se cruzam na vida real.
Se você estiver montando seu roteiro de Almodóvar em Madri, vale passar por ele, observar o movimento da rua e quem sabe subir até o terraço para ver a cidade do alto — talvez tentando imaginar o que Manuela sentia naquele momento, antes que tudo mudasse.
13. Colmeias da M-30
No final de O Que Eu Fiz Para Merecer Isso?, de 1984, a câmera se afasta lentamente, revelando os enormes blocos de apartamentos onde vivem os protagonistas.
Aquelas construções imensas parecem se dissolver no mar de edifícios da cidade, num plano que diz muito sem precisar de palavras. Esses blocos residenciais ficam junto à M-30, uma das principais vias de Madri, perto da mesquita do bairro de La Concepción.
Anos depois, Pedro Almodóvar revelou que essas construções o fascinavam desde antes da fama. Quando trabalhava em um depósito da Telefónica, passava todos os dias por ali e ficava impressionado com as “colmeias humanas” erguidas sobre a autoestrada.
O cenário transmite o peso do cotidiano, da sobrevivência, da vida empilhada — e termina o filme com um sentimento agridoce. Para quem quer explorar um roteiro de Almodóvar em Madri além dos pontos turísticos, esse pedaço da cidade guarda uma força silenciosa e poderosa.
14. Hotel URSO
Em Mães Paralelas, uma das cenas mais delicadas acontece no sofisticado Hotel URSO, onde Janis, personagem de Penélope Cruz, visita Arturo, de Israel Elejalde, no quarto em que ele está hospedado. O momento é íntimo, carregado de emoção — e o cenário reforça esse tom com uma elegância clássica que chama atenção já nos primeiros segundos.
O hotel fica na Calle de Mejía Lequerica, entre os bairros de Chamberí, Tribunal e Chueca, em um prédio histórico construído em 1915. O local foi originalmente sede da Papelera Española e o projeto neoclássico leva a assinatura do arquiteto José María Mendoza Ussía.
A fachada imponente, mirantes e varandas nobres se mistura a interiores que mantêm vitrais coloridos, painéis de madeira, pisos de mármore e até uma biblioteca. Tudo isso cria um ambiente cinematográfico por natureza — e o diretor, claro, soube explorar cada detalhe.
Para quem segue um roteiro de Almodóvar em Madri, esse é um dos lugares mais elegantes da lista — ideal para quem gosta de combinar história, arquitetura e cinema de maneira sutil e envolvente.
15. Teatro Lara
Poucos lugares representam tão bem a alma teatral dos filmes de Almodóvar quanto o Teatro Lara, um verdadeiro tesouro no coração da Corredera Baja de San Pablo. Em A Lei do Desejo, de 1987, Tina, vivida por Carmen Maura, interpreta a peça A Voz Humana, dirigida por seu irmão Pablo, personagem de Eusebio Poncela, nesse mesmo teatro.
E não é só: Antonio Banderas também aparece em cena ali, em um momento carregado de tensão e desejo.
Mas o Lara vai além desse filme. Em Tudo Sobre Minha Mãe, de 1999, os créditos finais aparecem sobre os cortinados vermelhos do palco, acompanhados da emocionante dedicatória de Almodóvar às mulheres, às atrizes e às mães.
Em Fale com Ela, de 2002, os créditos iniciais surgem sobre o mesmo pano de fundo. É como se o teatro fosse um símbolo do próprio ato de representar a vida — tema central em tantos filmes dele.
Inaugurado em 1880, o Teatro Lara é conhecido como la Bombonera, pela beleza de suas proporções e pela aura de prestígio que o cerca. A fachada tem estilo francês e um saguão com colunas de ferro fundido, que leva o visitante direto ao século 19.
Almodóvar não escolheu esse lugar por acaso: o Lara respira tradição, arte e emoção — tudo o que move seu cinema.
Para quem está seguindo um roteiro de Almodóvar em Madri, visitar o teatro é uma parada obrigatória, especialmente se houver alguma peça em cartaz. Sentar ali, sob as mesmas luzes, é um ato de reverência ao cinema e à arte que atravessa gerações.
16. Calle del Arenal
O final de Carne Trêmula foi gravado em um dos lugares mais movimentados e iluminados de Madri: a Calle del Arenal, pertinho da Puerta del Sol. Almodóvar aproveitou a decoração natalina para filmar cenas cheias de luzes e movimento, com direito a um plano que inclui a fachada do tradicional Museo del Jamón, que fica logo no início da rua.
O mais curioso dessa história é que o diretor rodou tudo discretamente, de dentro de uma van estacionada, misturando atores com transeuntes reais.
Foi só ao revisar as imagens que Almodóvar percebeu algo inusitado: em todas as tomadas, aparecia um homem com óculos parado na porta do bar. “Suponho que esse homem tinha marcado encontro com alguém que não aparecia”, disse o diretor depois.
Esse detalhe não planejado ficou no filme — e ajuda a entender como a cidade real, viva e imprevisível, sempre entra em cena. Se estiver seguindo um roteiro de Almodóvar em Madri, caminhar pela Calle del Arenal no fim da tarde, com as luzes acesas e o burburinho típico do Centro, é quase como assistir ao final do filme pela própria retina.
17. A Coroa de Espinhos
No suspense psicológico A Pele que Habito, de 2011, Pedro Almodóvar escolhe cenários com uma força visual quase hipnótica — e um dos mais impactantes é a sede do Instituto do Patrimônio Histórico Espanhol, na Cidade Universitária de Madri.
Conhecido popularmente como A Coroa de Espinhos, no o prédio se passa a cena em que o personagem de Antonio Banderas, já tomado por um desejo de vingança silenciosa, pronuncia uma conferência que carrega tensão do começo ao fim.
Projetado pelos arquitetos Fernando Higueras e Antonio Miró nos anos 1960, o edifício tem um estilo orgânico que chama atenção de longe. O próprio arquiteto Richard Rogers chegou a dizer que o lugar “transpira criatividade e energia até nos mínimos detalhes”.
Almodóvar escolheu o prédio por sua expressividade — e, de fato, ele parece estar em perfeita sintonia com o clima enigmático do filme. Para quem está seguindo um roteiro de Almodóvar em Madri, essa visita é uma oportunidade de ver como a arquitetura também pode se tornar personagem quando cai nas mãos do cineasta certo.
18. Calle de Segovia
Os Amantes Passageiros, de 2013, não está entre os meus preferidos de Almodóvar, mas, como sempre, o diretor consegue tirar algumas boas risadas com situações totalmente fora do comum.
Como a história se passa quase toda dentro de um avião, o Aeroporto de Madri–Barajas (MAD) aparece logo no início, abrindo o filme com aquele ar de caos controlado que combina com o tom da comédia.
Mas o que me chamou mesmo a atenção foi outra cena, filmada em um dos lugares mais simbólicos da cidade: a Calle de Segovia, com seu viaduto imenso e aquela escadaria que desce em direção à parte mais antiga de Madri.
O contraste entre esse cenário tradicional e toda a loucura do filme cria um efeito curioso. É um ponto que vale incluir no seu roteiro de Almodóvar em Madri, mesmo que o filme não esteja no topo da sua lista. A paisagem, por outro lado, merece destaque.
19. Rua Fernando VI
Em Julieta, de 2016, Almodóvar adapta contos da escritora canadense Alice Munro e os transporta para cenários espanhóis — e Madri, mais uma vez, ganha papel de destaque.
A princípio, o diretor chegou a considerar filmar no Canadá, como nos textos originais, mas a decisão final foi seguir com o projeto em solo espanhol. E foi na Rua Fernando VI, número 19, que ele encontrou o cenário perfeito para uma das partes mais emocionais da narrativa.
É nessa casa que a protagonista Julieta se reconstrói, vive o luto, escreve cartas que talvez nunca sejam lidas e tenta entender o vazio deixado pela filha. O prédio, com sua fachada sóbria e elegante, transmite uma solidão urbana que combina com o tom do filme.
O Colegio Estudio ta,bém aparece no filme. Ele foi inspirado na filosofia da Institución Libre de Enseñanza e nasceu com o objetivo de promover uma educação livre, crítica e humanista, mesmo durante os anos mais duros da ditadura. Até 1947, não tinha reconhecimento oficial e os alunos precisavam buscar seus diplomas em outros centros.
O espírito de liberdade intelectual do colégio dialoga com muitos dos temas recorrentes no cinema de Almodóvar — como personagens que desafiam padrões e buscam caminhos próprios.
Seguir um roteiro de Almodóvar em Madri também é isso: visitar espaços comuns que, quando passam pela lente dele, ganham uma carga emocional profunda. Ao passar por essa rua, é impossível não lembrar da dor contida de Julieta e do silêncio que preenche cada canto daquele apartamento.
20. Hemingway Cocktail Bar
Inspirado na estética clandestina da Lei Seca dos anos 1920,o Hemingway Cocktail Bar fica dentro do Hotel Casa Suecia e tem um ar de mistério cinematográfico que combina perfeitamente com os universos criados por Almodóvar.
O ambiente é puro espetáculo: sofás de veludo vermelho, chão com estampa animal print, paredes espelhadas com aspecto envelhecido e detalhes dourados que remetem a um passado teatral e dramático.
O destaque vai para o balcão, feito com o retábulo de uma capela francesa do século 17 — um toque extravagante e simbólico que poderia facilmente estar em uma de suas cenas.
Almodóvar usa o bar em seus filmes mais recentes como cenário para personagens sofisticados, intrigantes e cheios de segredos.
Em Mães Paralelas, é nesse ambiente sofisticado que os personagens de Penélope Cruz e Israel Elejalde se encontram para um pequeno momento de celebração — uma pausa breve e elegante no meio de uma história carregada de emoção.
Vale terminar o dia com um coquetel nesse espaço onde o tempo parece suspenso — como nas melhores histórias que ele gosta de contar.
Feche o dia com cinema
Nada melhor do que terminar esse passeio com uma noite almodovariana. Escolha um cinema como o Renoir ou o Golem para assistir a um de seus filmes. Depois, procure um bar em Lavapiés ou Malasaña — pode ser o El Viajero, o La Realidade ou algum outro que tenha cara de cena de filme.
Aproveite para refletir sobre o que viu, o que sentiu e o que Madri te mostrou através dos olhos do diretor. Esse roteiro de Almodóvar em Madri é também uma forma de redescobrir a cidade e se reconectar com a força do cinema como linguagem emocional.
